Total de visualizações de página

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Circuitos Neurais Centrais Envolvidos no Comportamento Alimentar

Um melhor entendimento dos mecanismos que regulam a homeostasia energética, é essencial para o entendimento das novas terapias contra a obesidade. O estado das reservas energéticas é sinalizada ao cérebro pelos sinais da adiposidade e saciedade. Estes sinais modificam tanto as vias anabólicas como as catabólicas, e consequentemente, alteram o comportamento de ingestão alimentar de acordo com o requerimento energético sinalizado. A homeostasia energética é mantida através da adaptação do tamanho da refeição e do atual estado energético (Fig. 1). 

Unfortunately we are unable to provide accessible alternative text for this. If you require assistance to access this image, please contact help@nature.com or the author
Fig. 1 - Integração dos sinais de saciedade do trato gastrointestinal e dos sinais de adiposidade do pancreas e tecido adiposo pelo SNC. Estes sinais são integrados e produzem mudanças na ingestão energética e dispêndio energético para manter a homeostasia energética. CCK: colecistocinina, GLP-1: peptídeo-1 semelhante ao glucagon, PYY: peptídeo YY.

Este controle é obtido pela comunicação entre o sistema digestivo e o sistema nervoso central (SNC). As informações dos estoques energéticos são retransmitidos do tecido adiposo e fígado para o cérebro via níveis circulantes dos sinais de adiposidade. As informações da qualidade e conteúdo de uma refeição são retransmitidos do trato gastrointestinal para o cérebro via sinais de saciedade. Os sinais são integrados no SNC, primeiramente no hipotálamo, para determinar o tamanho da refeição (Fig. 2).


Unfortunately we are unable to provide accessible alternative text for this. If you require assistance to access this image, please contact help@nature.com or the author
Fig. 2 - As vias envolvidas com o comportamento alimentar do NPY e melanocortina hipotalamico são primeiramente modulados pela leptina e insulina no núcleo arqueado (ARC). A leptina e insulina estimulam os neurônios POMC via receptores de leptina e insulina. Neurônios POMC promovem tanto a liberação de neuropeptídeos anorexigênicos CRH e CART no PVN, e inibem a liberação de neuropeptídeos orexigênicos orexina e MCH no LHA via liberação de NPY, e inibem a atividade neuronal POMC via liberação de AgRP e GABA. Leptina e insulina inibem neuronios NPY/AgRP via receptores de leptina e insulina, e assim, diminuem as entradas inibitórias GABAérgica para os neuronios POMC, que em última instância, aumentam a liberação de CRH e CART via PVN. Endocanobinóides hipotalâmicos estimulam a atividade neuronal NPY e inibem a atividade neuronal POMC. Endocanobinóides hipotalâmicos também são modulados pela leptina. A serotonina ativa neurônios POMC via receptores 5HT2C localizados nos neurônios POMC e inibem a liberação de AgRP dos neuronios NPY via receptores 5-HT-1B nos neurônios AgRP e nas projeções axonais inibitórias para neurônios POMC. O efeito geral da leptina e insulina é inibir a ingestão alimentar. 5-HT: sorotonina, EC: endocanobinóides, NPY: neuropeptídeos Y, AgRP: peptídeos relacionado ao gene agouti, GABA: ácido gama amino butírico, alfa-MSH: hormônio alfa-estimulante de melanócitos, CART: transcrito regulado pela anfetamina e cocaína, LHA: área hipotalâmica lateral, PVN: núcleo paraventricular, ORX: orexinas, OXM: oxintomodulina, MCH: hormônio concentrador de melanina, CRH: hormônio liberador de corticotrofina, insr: receptor de insulina, lepr: receptor de leptina, r: receptor.

A leptina é secretada primeiramente pelo tecido adiposo, e, os níveis circulante estão positivamente correlacionados com a adiposidade, e por isso é dito que a leptina sinaliza os estoques energéticos. Os receptores hipotalâmicas para leptina estão localizados no núcleo arquedado (ARC) nos neurônios neuropeptídeo Y (NPY) e pró-opiomelanocortina (POMC). Neurônios POMC e NPY se projetam do ARC para outras regiões hipotalâmicas como o núcleo paraventricular (PVN) e área hipotalâmica lateral (LHA). A liberação do hormônio alfa-melanócito estimulante e do transcrito regulado pela anfetamina e cocaína (CART) nestas áreas suprimem o comportamento de ingestão alimentar. Já a liberação de NPY nestas regiões estimula o comportamento de ingestão alimentar. Neurônios NPY também liberam a proteína relacionado ao gene agoute (AgRP) e o ácido gama-aminobutírico (GABA), e com isto, apresenta atividade tônica inibitória sobre os neurônios POMC via receptores de NPY (Y1) e indiretamente estimulam o comportamento alimentar. Assim,  neurônios POMC e NPY modulam o comportamento alimentar via liberação de neuropeptídeos anorexigênicos (e.g., hormônio liberador de corticotrofina - CRH) e neuropeptídeos orexigênicos (e.g., orexina e hormônio concentrador de melanocortina) respectivamente.

A ativação dos receptores de leptina no ARC estimula os neurônios POMC e inibe os NPY. Assim, quando os circulante níveis de leptina estão elevados, como por exemplo, após uma refeição, a leptina ativa neurônios POMC, e assim suprime o comportamento alimentar e inibe os neurônios NPY. Seguindo as reduções nos níveis circulante de leptina e no estado energético, os neurônios NPY são desinibidos, e assim, estimulam o comportamento alimentar e ao mesmo tempo inibem os neurônios POMC. A insulina age em paralelo com a leptina no ARC, e assim, exerceria os mesmos efeitos em situação similar após uma refeição. Contudo, é importante salientar que pacientes obesos, são resistentes a leptina e apresentam níveis circulantes elevados de leptina, porém estes níveis se reduzem com a perda de peso. Estes efeitos sobre a resistência à leptina aumentam a complexidade dos mecanismos envolvidos com o comportamento alimentar.

Os sinais de saciedade (e.g., colecistocinina - CCK; peptídeo YY3-36 - PYY3-36; e o peptídeo semelhante ao glucagon - GLP-1) são liberados pelo trato gastrointestinal durante a refeição em reposta volumétricas e calóricas de uma refeição. Os sinais de saciedade se ligam aos seus receptores específicos no nervo vago o qual envia as informações referentes ao cérebro. Estes sinais, e aqueles da rede hipotalâmica são integrados centralmente para determinar o tamanho da refeição. O peptídeo amilina, o qual é co-secretado com a insulina pelo pâncreas em resposta a uma refeição, também promove a saciedade. As redes do comportamento alimentar do NPY e melanocortina hipotalâmica também são modulados por diversos neurotransmissores, destacando-se aí, o sistema endocanobinóide e a serotonina (5-HT).

Os níveis hipotalâmicos de endocanobinóides flutuam com o estado nutricional, e a administração de agonistas e antagonistas dos receptores de canobinóides (CB1) causam hiperfagia e hipofagia respectivamente. Estes efeitos são mediados via modulação das vias do comportamento alimentar hipotalâmico. A leptina reduz os níveis de endocanobinóides, enquanto os antagonistas dos CB1 previnem o aumento do comportamento alimentar observado com a inibição das vias da melanocortina e NPY. Estes últimos efeitos podem ser mediados pelos receptores melanocortina 4. Os níveis no sangue de endocanobinóides estão elevados na obesidade, o qual implica um papel para a ativação dos CB1 no ganho de peso e no desenvolvimento dos fatores de riscos cardiometabólicos. Além do mais, medidas da atividade dos endocanobinóides com o acúmulo da massa de gordura visceral e abdominal estão correlacionados com a desregulação do sistema endocanobinóides periférico na obesidade humana. Assim, tanto os receptores CB1 central assim como os receptores CB1 periféricos são potenciais alvos terapêuticos contra a obesidade, e isto foi verificado até recentemente com a utilização de medicamentos antagonistas dos CB1,  que posteriormente foi retirado do mercado devido aos efeitos colaterais. 

A aumentada liberação de 5-HT causa hipofagia, enquanto a sua inibição causa hiperfagia. Estes efeitos são mediados pelos receptores 5-HT2C e 5-HT1B localizados nos neurônios POMC e NPY hipotalâmicos respectivamente. A estimulação dos receptores 5-HT2C promovem a liberação de alfa-MSH, o qual diminui o comportamento alimentar. A estimulação dos receptores 5-HT1B inibe a liberação de AgRP, desinibindo a via melanocortina levando ao decréscimo do comportamento alimentar. Este sistema é o alvo chave dos agentes anti-obesidade que estão sendo desenvolvidos, e de alguns já desenvolvidos. Por exemplo, existem medicamentos anti-obesidade que inibem a recapitação de noradrenalina e 5-HT, e este último neurotrasmissor pode exercer seus efeitos anorexigênicos via receptores 5-HT descritos anteriormente. 

Somente recentemente, tem-se identificado e melhor compreendido as complexas redes central e periféricas que regulam o comportamento alimentar, o que provêm muitos alvos potenciais para terapia anti-obesidade.  Contudo, apesar dos incríveis ganhos em nosso conhecimento sobre a homeostasia energética, muito ainda permanece desconhecido, principalmente ao se destacar os mecanismos que estimulam a alimentação excessiva. Mas acima de tudo, é possível verificar com base na revisão atual, que as redes neurais envolvidas com o comportamento alimentar é altamente plástica, e sujeita a inúmeras alterações. Isto abre a oportunidade de pensarmos sobre a importância da aderência e manutenção de hábitos saudáveis, como uma boa alimentação e prática de exercício físico, mesmo diante de a um ambiente obesogênico, pois, até o presente momento, estes dois comportamentos têm se mostrados excelentes medidas terapêuticas que não apresentam efeitos colaterais quando realizados na medida certa.




Juliano Machado
Doutorando em Fisiologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP (2011); Mestre em Fisiologia da Performance (UFPR - 2010); Especialista em Fisiologia do Exercício (UFPR - 2009);Especialista em Fisiologia do Exercício (Gama Filho - 2008); Licenciatura Plena em Educação Física (UNIVILLE - 2006).

Adicionar vídeo
Referência


Aronne LJ, Thornton-Jones ZD. New target for obesity pharmacotherapy. J Clin Pharmacol, 2007.


Nenhum comentário:

Postar um comentário