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sexta-feira, 27 de abril de 2012

IRISINA: Um Furacão Muscular no Destino do Tecido Adiposo

Hipócrates observou que, "caminhar é a melhor medicina do homem", e assim descobriu os benefícios do exercício físico para a saúde. Após dois milênio de anos, os benefícios da atividade física sobre a saúde e longevidade tem sido muito bem documentada. Atualmente os cientistas estão começando a entender os benefícios para a saúde a nível molecular, e começando a considerar a musculatura esquelética como um órgão  endócrino, capaz de se comunicar com outros tecidos através das miocinas, nas quais são liberadas na circulação durante a realização de atividade física. Num recente estudo, Boström et al. (Nature 2012, 481:463-468), identificou uma nova miocina, Irisina, na qual é liberada na circulação durante a realização de exercício físico e estimula a transformação de células adiposas brancas em células adiposas com um fenótipo similar as células adiposas marrom, fenômeno conhecido como "browning". 

Acima de uma década atrás, um co-ativador transcricional (uma molécula envolvida na regulação da expressão gênica) conhecido como co-ativador 1α do receptor ativado por proliferadores de peroxissoma gama (PGC-1α), foi identificado por ter um papel crítico na manutenção da homeostasia do metabolismo da glicose, lipídeos e energética. Foi verificado que o PGC-1α também está envolvido com processos patológicos associados com desordens relacionada com a obesidade, tal como diabetes, doença cardiovascular e neurodegeneração. Por outro lado, camundongos transgênicos portando a forma constitutivamente ativa da PGC-1α na musculatura esquelética, são resistentes a obesidade e ao diabetes relacionados com a idade, além de apresentarem uma aumentada expectativa de vida. Um achado que sugere que o PGC-1α associado aos seus efeitos na musculatura esquelética pode regular o metabolismo em outros tecidos, em especial, o tecido adiposo branco.

O objetivo do estudo de Boström et al., foi identificar o sinal que realiza um crosstalk entre a musculatura esquelética que expressa o PGC-1α e o tecido adiposo. Ao comparar os genes que são expressos na musculatura esquelética de camundongos controles (wild-type) com os transgênicos, eles observaram uma maior expressão de muitos genes codificados por certos produtos proteicos, incluindo a conhecida proteína contendo o domínio 5 da fibronectina do tipo 3 (FNDC5 - fibronectin type III domain containing 5). Os pesquisadores  observaram que a FNDC5 é proteoliticamente clivavada em um produto, o qual foi chamada de Irisina "Irisin", nome decorrente da deusa Grega Iris, e que sua expressão é aumentada na musculatura esquelética com o exercício tanto em camundongos como em humanos. Em humanos, foi observado que as concentrações de irisina no plasma aumentam após 10 semanas de treinamento regular com execício físico. 

Além disso, os pesquisadores injetaram em camundongos obesos, adenovírus expressando FNDC5, o qual resultava em níveis que eram de 3 a 4 vezes maiores do que os níveis observados no animais injetados com as partículas de adenovírus contendo o gene controle. O tecido adiposo de camundongos com maiores níveis de irisina no plasma, apresentavam maiores níveis de expressão da proteína desacopladora 1 (UCP1 - uncoupling protein 1), o qual é uma característica do tecido adiposo marrom. A proteína UCP1 é um canal da membrana mitocondrial interna responsável por desacoplar o gradiente de íons hidrônios (H+) do espaço intermembranas mitocondrial para a matriz mitocondrial, desviando a passagem dos íons H+ pela ATP-sintetase (e síntese de ATP) para a produção de calor. Esta mudança foi acompanhada por um aumento no dispêndio energético corporal total, modesta perda de massa corporal, e, melhoras modestas na intolerância à glicose (Figura 1).

Figura 1Cross-talk entre musculatura esquelética e tecido adiposo. O exercício físico estimula um aumento na expressão do PGC-1α. Boström et al., recentemente reportaram que o PGC-1α, um co-ativador transcricional, estimula a expressão de uma proteína de membrana, FNDC5, o qual é proteolíticamente clivada para a forma de irisina, uma miocina. A irisina estimula a transformação de células adiposas brancas em brite cells - células adiposas com um fenótipo similar as células adiposas marrom, como indicado por um marcado aumento na expressão da UCP1 no tecido adiposo branco. Os pesquisadores também mostraram que elevadas concentrações de irisina no plasma obtido através da reposição gênica, é acompanhada por uma redução na massa corporal e melhoras na homeostasia metabólica em camundongos obesos.


A visão de que humanos possuem tecido adiposo marrom agora é bem aceita. Além do mais, recentes evidências mostram que o metabolismo do tecido adiposo marrom é aumentado quando humanos adultos são expostos ao frio. Portanto, os achados de Boström et al. é que o exercício, através da irisina, tem a capacidade de ativar um fenótipo similar ao do tecido adiposo marrom, que provavelmente teria um significado clínico importante para o metabolismo em humanos. O que mais suporta esta conclusão é que a irisina de camundongos e humanos são proteínas idênticas, embora, seja necessário verificar se a irisina em humanos tem o mesmo efeito no tecido adiposo branco como ela faz em camundongos.

Boström et al., provêm uma explicação mecanicística do efeito benéfico do exercício sobre a proteção contra doenças metabólicas. Contudo, o estudo destes autores apresentam uma importância ainda maior sobre as bases conceituais para o entendimento de como a musculatura esquelética se comunica com outros tecidos. Hoje sabe-se que o exercício estimula a liberação de inúmeras miocinas, dos quais oferecem proteção contra inúmeras doenças como as cardiovasculares, diabetes do tipo 2, câncer, demência e osteoporose. Futuramente, será excitante entender a nível molecular como estes efeitos protetores são obtidos.

Diante dos efeitos anti-obesidade e anti-diabético da formação de tecido adiposo marrom em camundongos, é possível que pacientes que sejam incapazes de se exercitar devido a condições musculoesqueléticas ou cardiovasculares severas, pudessem se beneficiar diretamente pela descoberta da irisina. No entanto, devido ao fato de o exercício orquestrar uma inter-relação de inúmeras proteínas secretadas e não secretas, e assim, beneficiar de maneira direta ou indireta órgãos como o cérebro ou o sistema cardiovascular, é improvável que uma "pírola do exercício", irá trocar os efeitos totais de uma boa prática regular de exercícios. Diante disto, como notou Hipócrates, o autor deste excelente editorial publicado no New England Journal of Medicine (2012; 366:1544-1545/ April 19) sugere que se a pessoa se manter fisicamente ativa, ela ativará todas as miocinas de sua musculatura esquelética, e, seguindo a mesma linha de raciocínio, eu também concordo que ainda não foi encontrado algo que substitua os efeitos benéficos da prática regular do exercício físico sobre a saúde e longevidade, ao menos em humanos.

Juliano Machado
Doutorando em Fisiologia pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP (2011); Mestre em Fisiologia da Performance (UFPR - 2010); Especialista em Fisiologia do Exercício (UFPR - 2009);Especialista em Fisiologia do Exercício (Gama Filho - 2008); Licenciatura Plena em Educação Física (UNIVILLE - 2006).

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Referência


Pedersen BK. A muscular twist on the fate of fat. New England Journal of Medicine 2012; 366:1544-1545/ April 19.




Um comentário:

  1. Fiquei muito feliz em ter encontrado esta PUBLICAÇÃO, sobre a
    IRISINA, QUE É UM HORMÔNIO (medicamento perfeito produzido pelo organismo ao fazer exercícios físicos de qualquer natureza):E COM EFEITOS BENÉFICOS PREVENINDO O ALZEAIMER

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